FÁBIO
TAKAHASHI
DA REPORTAGEM LOCAL
O Conselho Regional de Medicina de São Paulo promoverá a partir de outubro um
exame profissional semelhante ao aplicado pela OAB (Ordem dos Advogados do
Brasil). A diferença é que os reprovados poderão exercer a profissão, mas não
receberão o certificado de aprovação do Conselho Regional de Medicina (SP),
uma espécie de selo de qualidade.
Sem a chancela, na avaliação do próprio conselho, os reprovados ou os que se
recusarem a fazer a prova terão dificuldades para arranjar um emprego. O teste
não será obrigatório.
"Com o certificado, o empregador verá que esse candidato está bem
preparado", afirmou Bráulio Luna Filho, conselheiro do Cremesp (Conselho
Regional de Medicina do Estado de São Paulo) e coordenador do grupo que
elaborou a prova.
Médicos ouvidos pela Folha disseram que o exame nesse formato terá pouco
efeito. "Quem não for aprovado será contratado como mão-de-obra barata
por hospitais com qualidade inferior", afirmou o diretor-geral do Incor
(Instituto do Coração), José Antônio Franchini Ramires.
O conselho de medicina decidiu criar o exame de ordem por entender que a
qualidade do ensino vem caindo nos últimos anos, o que gera um atendimento pior
à população. Segundo Luna Filho, em 1993, houve 1.200 denúncias de erro médico
no país. No ano passado, foram 3.388.
Um dos motivos para isso, segundo o Cremesp, foi a expansão no número de
cursos no país. "Hoje estamos com 144 faculdades no Brasil, mais do que os
EUA", disse o conselheiro.
A prova
Os dois primeiros anos do exame são considerados como experimentais pelo
Cremesp. Os aprovados, porém, já receberão o certificado. "Vamos ver se
esse formato avaliará o estudante de uma forma justa", afirmou Luna Filho.
Poderão participar estudantes do sexto ano ou os que se formaram no ano
anterior ao exame. Os reprovados poderão se inscrever no ano seguinte.
O Conselho Federal de Medicina vai acompanhar os resultados, pois pretende
estender a prova para o resto do país.
A participação será voluntária. O conselho espera que 1.200 estudantes se
inscrevam -cerca de metade do número de formandos no Estado na área.
O exame, que será em 9 de outubro, terá duas fases. A primeira contará com
120 testes. Quem tiver 60% de acerto passará para a etapa prática, em que serão
apresentados de oito a dez problemas médicos considerados corriqueiros, em que
o recém-formado deverá apresentar o raciocínio para solucioná-los. Além
disso, com a ajuda de bonecos, também será necessário mostrar conhecimentos
em atividades como entubação ou massagem cardíaca.
As inscrições, que serão gratuitas, começarão no próximo dia 25, no site www.cremesp.org.br.
O exame será aplicado pela Fundação Carlos Chagas.
A OAB, que aplica o exame de ordem mais tradicional do país, auxiliou o Cremesp
na criação da prova. A avaliação da OAB vem tendo alto nível de reprovação
-no Estado de São Paulo, por exemplo, 7% dos inscritos foram aprovados no último
exame.
Polêmica
A criação de exames profissionais é motivo de discussão no país. Em debate
realizado na semana passada pela Folha, dirigentes de ensino divergiram sobre o
tema.
Três dos debatedores no evento afirmaram que a aplicação da prova é
positiva. O secretário municipal da Educação de São Paulo, José Aristodemo
Pinotti -ex-reitor da Unicamp-, o presidente da OAB-SP, Luiz Flávio Borges
D'Urso, e o diretor da Faculdade de Direito da PUC-SP, Dirceu de Mello,
afirmaram que os formados com deficiência no ensino não deveriam exercer a
profissão, pois isso representa uma ameaça à sociedade.
O diretor da Faculdade de Medicina da USP, Giovanni Guido Cerri, discordou de
tal posição. Para ele, o exame pode levar a uma acomodação, o que evita as
mudanças necessárias para melhorar o ensino superior.
Além disso, de acordo com Cerri, a reprovação prejudica o estudante, que não
sabe da qualidade da faculdade quando resolve entrar na escola.
Os quatro debatedores, porém, concordaram que o maior problema no ensino
superior brasileiro foi a proliferação do número de universidades.
Em resposta, o Ministério da Educação (MEC) afirmou que vem fiscalizando a
qualidade do ensino superior e que está controlando a abertura de cursos.
De acordo com Mário Pederneiras, diretor do departamento de educação superior
do Ministério da Educação, em 2002, durante a gestão de Fernando Henrique
Cardoso (PSDB), foram abertos 113 cursos de direito; no ano passado (governo
Lula) foram 51.