Por falta de vagas na UTI, todos os dias os médicos do principal hospital do Piauí têm de decidir quais pacientes serão internados enquanto as obras de dois grandes outros hospitais estão abandonadas.
Talita tem 6 anos e nasceu
com uma deformação nos dois pés. Há pelo menos dois anos, a menina espera
por uma vaga para fazer a cirurgia em um hospital de Teresina. "Quem tem
dinheiro não precisa de governo. Ele vai e faz. Mas quem não tem (dinheiro)
precisa encarar a fila mesmo e esperar", diz Maria das Graças Silva, mãe de
Talita.
Nos corredores do Hospital Getúlio Vargas, a superlotação é cena comum. Lá,
os médicos quase sempre são obrigados a fazer uma difícil escolha. "No
pronto-socorro existe um grande número de pacientes que necessitam de UTI e
não temos o número de vagas necessárias. Então, tem que decidir quem vai
viver e quem não vai viver. Infelizmente, essa é a realidade que a gente
vive hoje", diz o médico do pronto-socorro Felipe Pádua.
"Esse dilema é um sofrimento nosso. Eu, como plantonista da UTI, tenho que escolher. Tem três ou quatro pacientes e a gente fica escolhendo qual é o mais viável, qual o mais fraco. É difícil a gente tomar essa decisão", diz o diretor José Cantuária.
Enquanto faltam vagas no
Getúlio Vargas, no hospital universitário do estado, que está em obras há 18
anos, apenas o ambulatório funciona. Nossa equipe esteve em uma parte
desocupada do prédio e encontrou uma estrutura grandiosa: salas com
aparelhos de ar-condicionado e móveis. Sem uso, tudo está se deteriorando.
O desperdício parece não ter fim: um equipamento de raio X, por exemplo, foi
adquirido ainda no início da construção do hospital. Ele foi instalado, mas
até hoje nunca funcionou.
Segundo os técnicos, a tecnologia é ultrapassada e não existem peças para
reposição, um problema que é também de vários outros aparelhos do hospital.
"Ainda existem alguns equipamentos que estão sem uso porque foram
equipamentos comprados para quando o hospital funcionasse", diz Carlos
Iglezias, médico e diretor do hospital universitário.
Outro exemplo de
desperdício de dinheiro público no Piauí é o hospital de urgência de
Teresina, uma obra que começou a ser construída há 16 anos e avaliada em R$
14 milhões, mas que nunca funcionou.
Hoje a estrutura está quase concluída. Muitos equipamentos já foram
comprados: macas, cadeiras e até uma cozinha industrial completa. A
capacidade deste hospital é de 300 leitos e 90% dos recursos são do governo
federal, mas não há previsão de inauguração.
"O dinheiro vem a prestações, então, não tem condições de pegar a obra e
terminar. Toda obra parada é como uma casa. Se você sai da casa e passa
algumas semanas sem ir lá, ela começa a se desgastar", diz João Orlando,
médico e secretário municipal de Saúde.