Falta de leitos faz médico selecionar paciente

01/05/2007 - 07h46 - GLOBO.COM

No principal hospital do Piauí, a superlotação é uma cena comum.
Enquanto isso, outros dois hospitais em obras estão abandonados.

 

Por falta de vagas na UTI, todos os dias os médicos do principal hospital do Piauí têm de decidir quais pacientes serão internados enquanto as obras de dois grandes outros hospitais estão abandonadas.

 Talita tem 6 anos e nasceu com uma deformação nos dois pés. Há pelo menos dois anos, a menina espera por uma vaga para fazer a cirurgia em um hospital de Teresina.  "Quem tem dinheiro não precisa de governo. Ele vai e faz. Mas quem não tem (dinheiro) precisa encarar a fila mesmo e esperar", diz Maria das Graças Silva, mãe de Talita.

Nos corredores do Hospital Getúlio Vargas, a superlotação é cena comum. Lá, os médicos quase sempre são obrigados a fazer uma difícil escolha. "No pronto-socorro existe um grande número de pacientes que necessitam de UTI e não temos o número de vagas necessárias. Então, tem que decidir quem vai viver e quem não vai viver. Infelizmente, essa é a realidade que a gente vive hoje", diz o médico do pronto-socorro Felipe Pádua.

"Esse dilema é um sofrimento nosso. Eu, como plantonista da UTI, tenho que escolher. Tem três ou quatro pacientes e a gente fica escolhendo qual é o mais viável, qual o mais fraco. É difícil a gente tomar essa decisão", diz o diretor José Cantuária.

 Estrutura grandiosa

Enquanto faltam vagas no Getúlio Vargas, no hospital universitário do estado, que está em obras há 18 anos, apenas o ambulatório funciona. Nossa equipe esteve em uma parte desocupada do prédio e encontrou uma estrutura grandiosa: salas com aparelhos de ar-condicionado e móveis. Sem uso, tudo está se deteriorando.

O desperdício parece não ter fim: um equipamento de raio X, por exemplo, foi adquirido ainda no início da construção do hospital. Ele foi instalado, mas até hoje nunca funcionou.

Segundo os técnicos, a tecnologia é ultrapassada e não existem peças para reposição, um problema que é também de vários outros aparelhos do hospital. "Ainda existem alguns equipamentos que estão sem uso porque foram equipamentos comprados para quando o hospital funcionasse", diz Carlos Iglezias, médico e diretor do hospital universitário.

 Hospital nunca funcionou

Outro exemplo de desperdício de dinheiro público no Piauí é o hospital de urgência de Teresina, uma obra que começou a ser construída há 16 anos e avaliada em R$ 14 milhões, mas que nunca funcionou.

Hoje a estrutura está quase concluída. Muitos equipamentos já foram comprados: macas, cadeiras e até uma cozinha industrial completa. A capacidade deste hospital é de 300 leitos e 90% dos recursos são do governo federal, mas não há previsão de inauguração.

"O dinheiro vem a prestações, então, não tem condições de pegar a obra e terminar. Toda obra parada é como uma casa. Se você sai da casa e passa algumas semanas sem ir lá, ela começa a se desgastar", diz João Orlando, médico e secretário municipal de Saúde.