Programa reduz mortes por infecção generalizada no Paraná
CLÁUDIA COLLUCCI
da Folha de S.Paulo
Um programa inédito na rede pública de saúde do país conseguiu
reduzir em 25% a mortalidade por sepse (infecção generalizada) nos
quatro maiores hospitais do Paraná. O Brasil, ao lado da Malásia, é
campeão mundial em número de mortes por sepse, com 250 mil óbitos por
ano.
A doença, que afeta por ano 400 mil pessoas no país, tem um custo
anual de R$ 17 bilhões ao sistema hospitalar --sendo que R$ 10 bilhões
são gastos com pessoas que acabam morrendo. Os dados são do Ilas
(Instituto Latino Americano de Sepse).
O foco do programa paranaense, bancado pelo governo estadual, é um
pacote de tratamento que associa o pronto-atendimento ao paciente,
medicação adequada e o emprego de terapias padronizadas, de acordo com o
que preconiza os organismos internacionais.
Segundo o médico Álvaro Réa Neto, diretor dos centros de terapia
intensiva do Hospital de Clínicas da UFPR (Universidade Federal do
Paraná), a redução da mortalidade por sepse foi verificada por um estudo
epidemiológico, que durante cem dias acompanhou 180 pacientes graves
internados nas UTIs do HC da UFPR, Hospital do Trabalhador (ambos em
Curitiba), Hospital Universitário de Londrina e Hospital Regional de
Cascavel.
O índice médio de morte por sepse nos hospitais passou de 64% para
48%. A estimativa é que 28 pessoas tenham sido salvas nesse período.
"A taxa de mortes ainda é alta. Há vários pontos que precisam ser
abordados, como a conscientização da população e a capacitação dos
médicos dos postos de saúde da periferia", diz Réa Neto.
Ele explica que quanto mais cedo o médico identificar a sepse e
encaminhar o doente para um hospital referenciado, maior é a chance de
sobrevivência. "Muitos dos doentes que chegam ao hospital com sepse vêm
dos postos, onde os médicos não a identificaram."
Para o intensivista Eliézer Silva, da equipe da UTI do hospital Albert
Einstein (SP) e presidente do Ilas, o principal problema para controle
da sepse no país está nos prontos-socorros de hospitais públicos. "Há
uma dificuldade de os pacientes serem adequadamente tratados em PSs
tumultuados."
Silva conta que no Brasil acontece um fenômeno que difere dos outros
países: a mortalidade por sepse dos doentes que vêm dos prontos-socorros
é semelhante aos que já estão no hospital e, portanto, mais sujeitos a
infecções e outras intercorrências. "Isso não acontece nos outros
países. É um sinal que não estamos tratando bem o doente que chega ao
PS."
No Einstein, por exemplo, foi montado o "time da sepse". Cada etapa do
tratamento, como o tempo de permanência no pronto-socorro, da
administração do antibiótico e o prazo para receber os exames do
laboratório, é monitorada.
"Essa estratégia de monitorar e auditar todo processo dá oportunidade
para equipe sempre tentar melhorar o atendimento daquele doente. Mas é
fundamental que a instituição reaja a essas informações."
Pelo menos 30 instituições brasileiras públicas e privadas já foram
treinadas pelo Ilas para conseguir diagnosticar e tratar precocemente a
sepse, mas, segundo Silva, falta no país uma política nacional que
padronize as condutas nos hospitais.
Ampliação
O programa do Paraná será agora ampliado para dez hospitais do Estado e,
a médio prazo, deve chegar a outros 30. A mudança de padrão no
atendimento possibilitou que a mortalidade por sepse na rede pública se
equiparasse às da rede particular, segundo Réa Neto.
"Até então, a perda de pacientes com quadros clínicos de gravidade era
duas vezes superior nos hospitais públicos. Mas, muitas vezes, o
hospital público tem os mesmos recursos do hospital privado e um pessoal
de bom padrão. O que falta é organizar os recursos e padronizar as
condutas."
O modelo do Paraná começa a ser "exportado" para outros Estados. Em
Brasília, por exemplo, a rede pública começa se organizar para implantar
um programa semelhante envolvendo profissionais de todas as unidades dos
hospitais no combate à doença, redução do tempo de internação em UTI e
dos gastos com tratamento.